Com quimono, lutadora londrinense Mayara Custódio tenta arrecadar dinheiro para disputar um torneio em Long Beach, nos Estados Unidos, em maio.
Oito horas da manhã. A rotina de Mayara Custódio se repete todos os dias. Acorda pela manhã, toma café e parte para os treinos de musculação e preparação física em uma academia. Das 12h30 às 15 horas, no tempo livre, o compromisso é outro. De quimono, a atual campeã mundial de jiu-jítsu vai à rua e se dirige a um semáforo em Curitiba, no bairro Água Verde, para vender balas. Desde o ano passado, Mayara tenta vender o maior número de balas possível para arrecadar recursos e disputar o campeonato mundial de jiu-jítsu, que acontecerá em Long Beach, nos Estados Unidos, em maio.
Com sorriso no rosto, no calor ou no frio, a londrinense de 32 anos se apresenta aos motoristas que circulam pela capital paranaense e tenta juntar recursos básicos para custear passagens aéreas, hospedagens e alimentação.
Depois de vender balas, ela retoma os treinos de jiu-jítsu no restante da tarde e durante a noite. A rotina só é quebrada quando chove ou por conta de competições. Por dia, consegue uma média de R$60, quando vende uma caixa inteira. Por mês, ela consegue arrecadar até R$ 1.800.
– Meu objetivo é conseguir R$5 mil, que vai me ajudar bastante. Estou motivada, o pessoal tem me ajudado e a aceitação está sendo boa. Às vezes, as pessoas não estão dispostas a ouvir ou não têm dinheiro, mas sempre têm uma palavra de incentivo, contou ela.
Ela completa.
– Estou ali, no sinaleiro, não vendendo balas, mas vendendo a minha viagem, o meu trabalho e que é o que eu amo, o jiu-jítsu.
Mayara começou a treinar jiu-jítsu em 2014, em Londrina, por influência do irmão mais novo, que já praticava a arte marcial. Como ela conta, “foi pegando gosto” e passou a participar de competições. Logo passou conquistar títulos e ter destaque. A “virada” veio no ano passado, quando disputou a final do Campeonato Brasileiro de jiu-jítsu, chamou a atenção de donos de uma academia em Curitiba e recebeu um convite para mudar de cidade.
“Anjo” financiou última viagem da atleta
Em janeiro, Mayara conseguiu participar de um campeonato de jiu-jítsu na Europa com a ajuda de um “anjo”. Uma mulher parou no sinal e, depois de ouvir a história da lutadora e o sonho de disputar a competição, pagou as passagens aéreas e a estadia, um custo de R$5 mil. No torneio, ficou em terceiro lugar na categoria Super Pesado e em segundo lugar no Absoluto, ambas nas graduações faixa roxa adulto.
– Eu tinha até desistido de ir, faltava só três semanas para o campeonato. Era quase R$5 mil. Ela disse “vou dar um jeito de você ir, você vai para essa viagem”. Eu fiquei com o custo da alimentação. Depois, ela virou até a minha amiga.
Mayara é a atual campeã mundial master em duas categorias – Peso Super Pesado e Absoluto (IBJJF 2018), foi duas vezes campeã sul-americana na categoria Super Pesado (IBJJF 2017 e 2018) e também duas vezes campeã brasileira na categoria Super Pesado (CBJJ 2015 e 2016).
Federação vê com naturalidade venda de balas
Em contato com o GloboEsporte.com, a Federação Paranaense de Jiu-Jítsu encara com naturalidade o fato de Mayara se dividir entre treinos e semáforos para arrecadar recursos. O presidente da entidade, Sebastian Lalli, também é professor de Mayara e diz que atitudes como a da aluna são comuns no mundo do jiu-jítsu.
– Eu também corri muito atrás (quando era atleta), trabalhava em outro horário para conseguir recursos. (Vender balas no sinaleiro) É a maneira que eles acharam para conseguir participar dos campeonatos e eventos, fazendo um trabalho que não exige tanto tempo e eles também conseguem conciliar com os treinos. Também fazemos rifas na academia, o que eu consigo, também ajudo.
Segundo Lalli, como muitos dos atletas ainda não têm uma graduação necessária para dar aulas, a opção acaba sendo arrecadar recursos vendendo balas, por exemplo.
– Se eles forem trabalhar, terão um horário fixo, e vão conseguir treinar só uma vez por dia. Hoje, um atleta de alto nível tem dois, três treinos por dia, todos os dias. A profissão deles é treinar. Eles correm atrás, fazem rifas, tudo para conseguir dinheiro para inscrição, passagens etc. Realmente é um investimento alto para no futuro conseguir colher os frutos.
Ainda de acordo com o presidente, a Secretaria Municipal do Esporte, Lazer e Juventude (SMEL) dá bolsa para alguns atletas com graduação faixa preta.
– Quem precisa de mais ajuda é quem está começando, como faixas azul, roxa e marrom. Atleta faixa preta já tem patrocínios. O importante seria investir na base, porque é o que pode render frutos, essa safra de 17, 18 anos.
Fonte e créditos: https://globoesporte.globo.com/pr/noticia/campea-mundial-de-jiu-jitsu-vende-balas-em-semaforo-de-curitiba-para-seguir-lutando.ghtml